O
processo de adoecimento vem tendo diferentes visões e proporções no decorrer do
desenvolvimento das ações de assistência e promoção da saúde, além-claro, de vir
passando por mudanças culturais dentro das sociedades. Antigamente, o
adoecimento era limitado às questões físicas, corporais, onde o sujeito era
visto como aquele que adentrava ao processo de finitude de sua vida, fato
verificado por conta da pouca expectativa de vida que era conferida nos séculos
passados, principalmente pela falta de condições básicas de manutenção da
saúde, como o saneamento básico, a disponibilidade de uma alimentação mais
equilibrada, além de serviços de saúde mais acessíveis, com infraestrutura e
qualidade.
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Este
processo, marcado pela aproximação da finitude, era focado em amenizar as
queixas físicas do paciente, principalmente com relação à dor, alimentação e
eliminações. No entanto, este cuidado não era encarado em sua magnitude,
ficando algumas questões em segundo plano, como a atenção psicossocial ao
paciente, à família e também aos profissionais de saúde que estão envolvidos no
cuidado. Além disso, o ambiente também era pouco explorado e estudado, o que
também contribuía para a piora deste paciente.
Com o
passar dos anos, a visão sobre as questões do adoecimento mudaram de modo mais
expressivo, mas ainda sob um olhar mais hospitalocêntrico, medicalizado; porém,
vale destacar algumas variáveis que vinham se perdendo com o avanço tecnológico
e que agora voltam a ser mais exploradas e reincorporadas ao cuidado, como por exemplo, a reaproximação da família junto à assistência deste paciente, passando a dividir uma série de cuidados com aos
profissionais de saúde e também a assumir o cuidado integral no ambiente
domiciliar, sendo também assistida pelos profissionais, sob os cuidados das
visitas domiciliares.
Seguindo
a cronologia das mudanças e avanços na interpretação do processo do adoecimento,
temos a criação dos Cuidados Paliativos, na década de 1960, tendo a filosofia
aperfeiçoado as práticas de cuidado de enfermos acometidos por doenças
ameaçadoras da vida ou que não possuem mais condições de mudança de seu curso.
Destaque-se dos princípios dos Cuidados Paliativos a mudança neste conceito de
adoecimento, que vem sendo discutido no texto, dando um olhar mais
amplo, complexo, holístico, explorando a resolução das pendências familiares,
profissionais e claro, do próprio paciente. O conceito de "unidade de
cuidado" desenvolvido pelos Cuidados Paliativos atribui inovação ao modo como se interpreta o processo do adoecimento, sendo um referencial em termos de atenção integral aos cuidados do paciente, família e profissionais de saúde envolvidos.
A
unidade de cuidado é mantida sob esta tríade, atribuindo novos papéis a cada
agente citado. Além disso, passa a incorporar novos conceitos e contextos ao
processo de adoecimento, acrescentando soluções para as mais diversas situações
e somando à qualidade de vida do paciente e sua família.
O processo do adoecimento incorporou novos conceitos, como as redefinições
de corpo e doença. Para o paciente, o corpo é o meio de realização de seus
desejos, que quando doente, passa a limitá-lo a tais conquistas, gerando a
sensação de vulnerabilidade; além disso, há a sensação de não pertencer a si
mesmo, como se tivesse perdido o controle sobre seu componente físico e estivesse
sem meios para a concretização de suas vontades. Esta percepção gera muita
frustração, raiva e impotência, uma vez que o
enfermo, antes sujeito de suas ações, agora passa a ser "paciente",
necessitando da atenção e dos cuidados da família, profissionais e comunidade
como um todo. Além da frustração, a doença promove o medo pela possibilidade da
morte, que é fator intrínseco neste paciente, o que leva uma perda esporádica
ou definitiva dos interesses e objetivos de vida. Este paciente desenvolve a
chamada "ferida narcísica", que corresponde ao fato do sujeito não
enxergar melhora ou possibilidades para tal, uma vez que seu ego está ferido,
pela impossibilidade de, em certo grau, não poder responder por si em algumas
circunstâncias, devido às limitações impostas pela doença. Diante disso, o
paciente fica resistente e incrédulo com sua situação, podendo desencadear
outros acometimentos, como a depressão, a ansiedade, entre outros.
Assim,
temos que o processo do adoecimento é cercado de reações, sentimentos e
emoções, necessitando também de atenção, não só para o paciente, mas como para
toda a unidade de cuidado. É importante salientar que as ameaças e frustrações
citadas no parágrafo anterior também se incluem para a família, por conta da
perda de perspectiva e impossibilidade de acompanhar o crescimento e futuro
daquele ente, bem como para o profissional que pode se frustrar ou se sentir
impotente frente ao sofrimento.
Falando
um pouco sobre como a doença é vista, se tem que ela atinge a subjetividade do
sujeito e família, ou seja, é capaz de descaracterizar o paciente frente ao seu
papel dentro da família e comunidade, sendo que o mesmo passa a se ver como incapaz
de executar suas ações seja como o pai provedor, a mãe que cuida dos filhos, o
irmão mais velho que se considera exemplo aos demais, etc. Além disso, a doença promove várias limitações ao sujeito, que passa a evitar determinadas
situações, onde se julga mais exposto, para evitar constrangimentos, tendo como
consequência de tal atitude, o isolamento social.
A doença
avançada leva a vários sofrimentos e estes, por sua vez, desencadeiam uma série
de preocupações aos pacientes, tendo destaque o pedido de perdão diante das
desavenças e intempéries que ocorreram no passado, a impossibilidade de falar
com o médico antes da morte e o medo de morrer sozinhos, entre outras.
As
características citadas são comuns no ambiente domiciliar, junto à família e
visitas domiciliares dos profissionais de saúde. Já no contexto da
hospitalização, temos uma batalha firmada neste processo de saúde-doença, pois
o hospital é visto como um retrocesso em termos de evolução da doença, encarado
como um dos leitos de morte, uma vez que a maioria das mortes, atualmente,
ocorrem no hospital. A partir do momento que o paciente é hospitalizado, as
mesmas características de despersonalização, limitação e afastamento social são
evidenciadas, porém, ocorrem de modo mais expressivo, uma vez que o enfermo não
se encontra em seu ambiente natural, junto à família, com conforto e
privacidade, sendo um fator que contribui para deprimir o humor deste paciente.
É importante frisar que o modo como enfrentam a hospitalização influencia em
seu processo de reabilitação e interfere no decorrer da estabilização do
quadro.
A
participação da família junto ao cuidado durante a hospitalização é
fundamental, uma vez que consiste em um dos elos para se estabelecer as
relações de confiança do cuidar entre ela, a equipe de saúde e o paciente. Esta
presença familiar promove impactos positivos no processo de recuperação do
paciente, contribuindo para definir um ambiente protetor, o que ajuda num
melhor enfrentamento da situação. Além da presença, a família também divide o
cuidado no contexto hospitalar, favorecendo o dinamismo na rede de suporte, o
que evita a sobrecarga de trabalho dos profissionais de saúde.
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Pensando
neste envolvimento familiar, vale frisar que a família também faz parte da
unidade de cuidado e que necessita de atenção especial para seguir firme diante
do processo de adoecimento, o qual é bastante complexo e exigente com estes
cuidadores. A grande consequência é a sobrecarga de trabalho e a labilidade
emocional que o estresse proporciona, devendo esta família receber todo o tipo
de apoio, enfatizando-se o papel das redes de suporte, que devem acolher a
família, proporcionando conforto e apoio. Os responsáveis por tais tarefas
geralmente são os próprios profissionais de saúde, parentes, amigos, vizinhos e
demais conhecidos.
Resumindo,
o processo de adoecimento, sob a ótica dos cuidados paliativos, é visto como um
amplo e complexo contexto, marcado pela necessidade de atenção e assistência de
toda a unidade de cuidado, ou seja, paciente, família e profissionais de saúde
precisam trabalhar as dimensões físicas, mentais, espirituais e sociais, a fim
de proporcionar conforto e qualidade de vida a todos os envolvidos na assistência
à saúde do sujeito.
REFERÊNCIAS
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